Medicina Veterinária Domiciliar: Histórico e Fundamentos
ATENDIMENTO VETERINÁRIO A DOMICÍLIO Ainda que comum na prática profissional médico veterinário, o atendimento a domicílio é objeto de escassas pesquisas sobre a temática, tanto em âmbito nacional como internacional.
ATENDIMENTO VETERINÁRIO A DOMICÍLIO
Ainda que comum na prática profissional médico veterinário, o atendimento a domicílio é objeto de escassas pesquisas sobre a temática, tanto em âmbito nacional como internacional.
O atendimento a domicílio é pouco conhecido pelos tutores. Em uma pesquisa nos EUA com 986 tutores de cães e gatos apenas 35% dos respondentes sabiam da existência desta modalidade de atendimento veterinário (HEUBERGER; PIERCE, 2017).
O atendimento veterinário a domicílio ocorre há muitos anos nas áreas rurais para o tratamento de grandes animais, mas a prestação deste serviço para animais de companhia é mais recente.
Dentre os principais benefícios desta modalidade de atendimento a animais de companhia, estão a conveniência de não precisar transportar o animal até uma clínica, a economia de tempo, o atendimento potencialmente mais personalizado e por gerar menos estresse aos animais atendidos. (GEISSLER, 2003).
Para os gatos, a experiência de transporte e a permanência em uma clínica veterinária pode ser estressante, resultando em agressividade e outras alterações comportamentais que se iniciam no atendimento veterinário e podem perdurar até depois do retorno do animal à sua residência (MARITI et al., 2016).
Em cães verificou-se que a pressão arterial sistólica, as frequências cardíacas e as concentrações séricas de glicose e cortisol tendem a se elevar em atendimentos em ambiente clínico-hospitalar, quando comparadas com atendimentos na residência no animal (SOARES et al., 2012).
As principais vertentes de atendimento veterinário a domicílio identificados na literatura são: atendimento a domicílio acadêmico; cuidados paliativos a domicílio; fisioterapia e reabilitação a domicílio.
Atendimento a Domicílio Acadêmico
No Estado de Arizona (WOZNIAK et al., 2018), o atendimento veterinário a domicílio para animais de companhia é promovido pelo cursos de graduação em medicina veterinária do Midwestern University. Seu trabalho veterinário é realizado em associações não-governamentais de abrigo de sem-teto, no qual é prestado, de forma integrada, tanto serviços de saúde humana (atendimento médico, fisioterapia e odontológico) como serviços veterinários a seus animais de estimação, tais como, atendimento clínico, castração e cirurgias de pequeno porte.
A Colorado State University possui um programa de treinamento de seus estudantes de medicina veterinária para a prestação de cuidados paliativos a domicílio, prestando tanto suporte aos animais como a seus tutores (BISHOP et al., 2008).
Cuidados Paliativos a Domicílio
No âmbito dos cuidados paliativos, o atendimento a domicílio é compreendido como uma forma de promover na residência do tutor, o conforto e a qualidade de vida de pacientes geriátricos, sendo apresentado como uma alternativa ao internamento a longo prazo (HEUBERGER; PIERCE, 2017).
O cuidado paliativo a domicílio atualmente extrapola sua delimitação inicial de cuidado de pacientes geriátricos, buscando também mitigar o desconforto vivido pelos animais em tratamentos veterinários tradicionais. Para tanto, propõe adaptações do ambiente e das rotinas do animal e de seu tutor, como a correção de pisos escorregadios, ajuste da altura dos comedouros e o uso de andadores (DOWNING; ADAMS; MCCLENAGHAN, 2011).
Neste contexto, de cuidado paliativo domiciliar, o médico veterinário atua não apenas nos aspectos diretos da saúde e do conforto do paciente , e também atua igualmente na orientação dos tutores na preparação da morte natural ou na eutanásia de seus animais (SHEARER, 2011).
Fisioterapia e Reabilitação a Domicílio
A reabilitação de animais a domicílio ocorre em continuidade com as intervenções clínicas e cirúrgicas realizadas em ambiente clínico-hospitalar. Um plano de reabilitação veterinária domiciliar tem por característica destacar o papel do tutor na realização das rotinas prescritas e na adequação do ambiente às novas necessidades do paciente. Nesse contexto o papel do médico veterinário é de avaliar continuamente o processo recuperação do animal (SIMS; WALDRON; MARCELLIN-LITTLE, 2015).
Um caso de Síndrome do Nadador em um Schnauzer miniatura foi tratado por fisioterapia a domicílio da Coreia do Sul com modificação do ambiente, suporte nutricional e fisioterapia por 40 dias, que resultou na recuperação do animal (KIM et al., 2013).
Atendimento Veterinário a Domicílio no Brasil
No Brasil, o atendimento médico veterinário a domicílio é uma prática profissional comum, porém é objeto de escassa pesquisa, dificultando a caracterização deste campo de atuação profissional médico veterinário.
Nos artigos acadêmicos nacionais foi encontrado apenas um relato de caso que cita a realização de atendimento veterinário domiciliar de cão de oito anos, raça Fila Brasileiro diagnosticado com Babesiose e Erliquiose (FONSECA; SOUSA; MOURA, 2010).
Ademais, há o registro de uma política pública de atendimento veterinário domiciliar, realizada pela Coordenadoria de Bem-Estar Animal (COOBEA) do Município de Florianópolis-SC, denominada Atendimento Veterinário Domiciliar Emergencial (CASTRO, 2011).
No âmbito acadêmico, destaca-se as atividades de extensão universitária realizadas no contexto da Saúde Única pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) e pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
O Departamento de Veterinária da UFV mantém o projeto de extensão “Programa de Estratégias em Saúde Animal e Humana (PROESAH)” que atua junto aos Núcleos de Saúde da Família (NASF) do município de Viçosa/MG. Atuam no programa professores, estudantes de graduação e pós-graduação em medicina veterinária, além de médicos veterinários residentes. São realizadas, em conjunto das equipes dos NASF visitas domiciliares, nas quais são feitos cadastros das famílias e seus animais. Nestas visitas são passadas orientações sobre posse responsável, bem-estar e nutrição animal, esterilização, zoonoses, cuidados sanitários, dentre outros temas correlatos (WIDMER et al., 2016).
A Faculdade de Medicina Veterinária da UFPel mantém o projeto de extensão “Medicina Veterinária na promoção da saúde humana e animal: ações em comunidades carentes como estratégia de enfrentamento da desigualdade social” que presta atendimento clínico extra campus em ambulatório clínico localizado em comunidade carente (CLEFF et al., 2020). Prestou, entre 2011 e 2012, atendimento domiciliar a tutores que possuíam grande número de cães e gatos, de forma que todos os animais pudessem ser atendidos simultaneamente (ROSA JUNIOR et al., 2012).
No aspecto legal, não há lei no Brasil que regulamente especificamente o atendimento médico veterinário a domicílio, bem como não existe regulamentação específica emanada pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária – CFMV.
Há, todavia, algumas regulamentações emitidas por Conselhos Regionais de Medicina Veterinária (CRMV) disciplinando o atendimento à domicílio. Foram identificados quatro CRMVs que emitiram resoluções sobre o tema: CRMV-MT, CRMV-MS, CRMV-ES e CRMV-MG.
A definição de atendimento médico veterinário domiciliar é idêntica nas resoluções dos CRMV-MT, CRMV-MS e CRMV-ES, sendo que a definição do CRMV-MG difere apenas em sua redação, não em seu conteúdo.
Para os 3 primeiros CRMVs citados anteriormente considera-se atendimento médico veterinário domiciliar aquele onde o profissional se desloca até o domicílio do paciente para realizar o atendimento” (CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA VETERINÁRIA DO ESTADO DE MATO GROSSO, 2015; CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA VETERINÁRIA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL, 2017; CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA VETERINÁRIA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, 2018).
Para o CRMV-MG “considera-se atendimento médico veterinário domiciliar aquele onde o Médico Veterinário se desloca até o local do domicílio do responsável pelo paciente” (CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA VETERINÁRIA DO ESTADO DE MINAS GERAIS, 2019).
Para o presente trabalho adota-se a definição de atendimento veterinário a domicílio como aquele onde o profissional se desloca até o domicílio do paciente para realizar o atendimento. Ademais, adota-se como definição operacional de Atendimento Veterinário a Domicílio o conceito apresentado por CRMV-MT (2015), CRMV-MS (2017) e CRMV-ES (2018).